quarta-feira, 14 de outubro de 2020

É importante, mas não se faça!

     O que se passou na sessão extraordinária da Assembleia Municipal (AM) de Castro Daire, no passado dia 13/10/2020 é sintomático do “estado a que chegamos”.

Não falo do simulacro de democracia que foram as “eleições”(?) para a CCDR. Delas falaremos noutra altura. Falo do segundo ponto da ordem de trabalhos dessa sessão.

Contextualizemos a questão. Após as eleições autárquicas de 2017, tivemos notícia de que o Executivo anterior havia deixado cerca de € 700.000,00 de dívida em fornecimento de bens e serviços prestados, sem documentação de suporte e que não podiam incorporadas no relatório de gestão de 2017. O actual Executivo (e bem porque na defesa do bom nome do Município de Castro Daire) encetou uma serie de diligências para apurar da veracidade das dívidas e proceder ao pagamento das mesmas, assim que lhe fosse legalmente possível.  Foi necessário recorrer a um tribunal arbitral para que as dividas fossem reconhecidas e pagas. Em Maio de 2020 foram proferidas as sentenças e as dividas reconhecidas foram pagas até Setembro do presente ano.

Na sessão ordinária de Setembro último, o Executivo trouxe ao conhecimento da AM o teor das sentenças e das ordens de pagamento. Durante o debate, um deputado socialista desafiou os demais colegas presentes (em particular os com formação jurídica) para aprofundar o debate sobre assunto, até face às referidas sentenças que falavam de responsabilidades pessoais dos titulares de órgãos políticos e necessidade de serem comunicadas ao Tribunal de Contas. Da bancada do PS ninguém se opôs a essa sugestão. O líder da bancada do PSD concordou com a oportunidade e necessidade do debate. Ciente da necessidade de maior estudo do assunto, o representante do CDS-PP sugeriu que o se fizesse noutra AM exclusivamente com esse assunto. Ficou no ar até a possibilidade de todos os deputados municipais consultarem os processos judiciais para preparar esse debate.

A Mesa da AM teve o cuidado de consultar o processo e percebeu a dificuldade da tarefa para todos e para os serviços do Município. E propôs aos partidos políticos a criação de uma comissão para estudo do processo e elaboração de um relatório que facilitasse a todos o debate do assunto. Todos concordaram com a proposta e o assunto foi levado à sessão de 13/10/2020 da AM, órgão que tem a competência de decidir  sobre a formação da referida AM.

O que se passou a seguir foi surreal e surpreendente. Da parte do líder da bancada do PSD surgiu o elogio à proposta; a manifestação de dúvidas quanto à sua oportunidade e alcance e a recomendação de que a Mesa a retirasse, incumbindo-se de acompanhar o estado do processo junto do Tribunal de Contas. Vários deputados (do PS e PSD) expressaram o desacordo com a criação da comissão: a maioria furando a unanimidade sobre o debate que fora proposto e tacitamente aceite na sessão anterior. O CDS-PP, na minha pessoa, manteve-se fiel ao que havia sempre dito: o assunto é importante e merece um debate mais profundo e uma comissão seria um bom método para o fazer de forma mais rápida, digna e competente.

A Mesa decidiu retirar a proposta e, se nada for feito, o assunto: ou morre por aqui (apesar de todos reconhecerem a importância de ser debatido mais profundamente) ou está nas costas do único órgão que soube estar à altura do seu papel (a Mesa da AM), demitindo-se a maioria dos deputados das suas competências legais, éticas e politicas.

Haverá razões para que se não investigue o assunto? Para que se não debata o que todos achamos ser importante debater? Pessoalmente não vejo nenhuma! Se alguém for capaz de as fornecer, disponha!

Carlos Bianchi

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