quarta-feira, 28 de outubro de 2020

Castro Daire, 2020-2030

Quem não teve ainda a oportunidade de ler o documento “Visão Estratégica para o Plano de Recuperação Económica de Portugal 2020/2030”, faria bem perder algum tempo como mesmo. Isto dito, não significa que se concorde com o mesmo, na íntegra ou sequer em parte. Significa, tão-só, que se pode, no documento encontrar um trabalho de planeamento que pode e deve ser repetido à escala da região ou, no caso de Castro Daire, do concelho. Sim, do concelho! Sim, deve ser repetido! Melhor dizendo deve ser feito!

Castro Daire definha há décadas, sem vislumbrar nas políticas municipais uma qualquer visão estratégica, um qualquer simulacro de aposta de desenvolvimento integrado do concelho. Tudo parece resumir-se ao assegurar do alimentar das máquinas e estruturas partidárias, promovendo-se o emprego e algum investimento públicos, de modo desgarrado e não concertado. Mesmo as mais recentes apostas na área do Turismo (pré-Covid 19) surgem de modo aleatório, sem aparente planeamento e orientação. Dir-se-ia que se segue a máxima latina “alea jacta est” (os dados estão lançados), esquecendo que a mesma é atribuída a um general que dependida da sorte, mas muito mais da estratégia (Júlio César).

O concelho perde população há mais de 20 anos. O sector primário sofre da desertificação crescente do Interior nacional e da inexistência de rede de apoio técnico-científico e comercial. O sector secundário está reduzido a quase nada, pela falta de plataformas logísticas dignas e modernas. O sector terciário degrada-se diariamente por não conseguir captar novos clientes e por diariamente assistir à sangria do território. Nem todo o concelho está ainda suficientemente dotado de infraestruturas essenciais à vida quotidiana, como fornecimento de água ou saneamento básico. Com cada vez menos gente e menos empresas é inevitável a perda de receita para o Município o que levará à diminuição de capacidade de mudar o estado a que chegamos. Sem qualquer pessimismo, mas cientes dos dados disponíveis, pode dizer-se que ainda vamos a tempo? A janela disponível é curta, mas ainda existe.

Dir-se-á que os recursos são escassos e limitados e os problemas exigem largos investimentos. Nada mais errado! Envolverá assim tantos custos estabelecer protocolos com as academias de modo a estudar, planificar e apoiar os investimentos, mais adequados e lucrativos, na agricultura e na exploração silvo-pastoril castrenses? Será assim tanto oneroso estabelecer uma rede de apoios aos custos de contextos das actividades dos sectores primário e secundário? Será assim tão difícil apoiar a captação de emprego, suportando, por exemplo, as necessidades de transporte de quem vive fora do concelho? Será impossível aproveitar alguns gabinetes municipais para captar, apoiar e promover novos investimentos económicos? Será assim tão oneroso aproveitar as condições técnicas de um concelho quase 100% fibra para instalar, por cá, algumas dos projectos de inovação tecnológica? O que se passou recentemente, quando do confinamento de março, não permitiu verificar que, com pouco investimento, é possível ver-se novas formas de comércio, novos modos de publicitação dos produtos e do concelho?

O que agora se questiona não é novo, nem é de agora! E tempos houve que se soube diagnosticar os problemas do Concelho, de delinear respostas para esses problemas e de as publicitar. Pena que se tenham perdido anos com a incapacidade de implementar as respostas e se tenham alienado oportunidades de colocar Castro Daire no curso do desenvolvimento económico e social que permita que todos tenham, por cá, as oportunidades que procuram.

Carlos Bianchi

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

É importante, mas não se faça!

     O que se passou na sessão extraordinária da Assembleia Municipal (AM) de Castro Daire, no passado dia 13/10/2020 é sintomático do “estado a que chegamos”.

Não falo do simulacro de democracia que foram as “eleições”(?) para a CCDR. Delas falaremos noutra altura. Falo do segundo ponto da ordem de trabalhos dessa sessão.

Contextualizemos a questão. Após as eleições autárquicas de 2017, tivemos notícia de que o Executivo anterior havia deixado cerca de € 700.000,00 de dívida em fornecimento de bens e serviços prestados, sem documentação de suporte e que não podiam incorporadas no relatório de gestão de 2017. O actual Executivo (e bem porque na defesa do bom nome do Município de Castro Daire) encetou uma serie de diligências para apurar da veracidade das dívidas e proceder ao pagamento das mesmas, assim que lhe fosse legalmente possível.  Foi necessário recorrer a um tribunal arbitral para que as dividas fossem reconhecidas e pagas. Em Maio de 2020 foram proferidas as sentenças e as dividas reconhecidas foram pagas até Setembro do presente ano.

Na sessão ordinária de Setembro último, o Executivo trouxe ao conhecimento da AM o teor das sentenças e das ordens de pagamento. Durante o debate, um deputado socialista desafiou os demais colegas presentes (em particular os com formação jurídica) para aprofundar o debate sobre assunto, até face às referidas sentenças que falavam de responsabilidades pessoais dos titulares de órgãos políticos e necessidade de serem comunicadas ao Tribunal de Contas. Da bancada do PS ninguém se opôs a essa sugestão. O líder da bancada do PSD concordou com a oportunidade e necessidade do debate. Ciente da necessidade de maior estudo do assunto, o representante do CDS-PP sugeriu que o se fizesse noutra AM exclusivamente com esse assunto. Ficou no ar até a possibilidade de todos os deputados municipais consultarem os processos judiciais para preparar esse debate.

A Mesa da AM teve o cuidado de consultar o processo e percebeu a dificuldade da tarefa para todos e para os serviços do Município. E propôs aos partidos políticos a criação de uma comissão para estudo do processo e elaboração de um relatório que facilitasse a todos o debate do assunto. Todos concordaram com a proposta e o assunto foi levado à sessão de 13/10/2020 da AM, órgão que tem a competência de decidir  sobre a formação da referida AM.

O que se passou a seguir foi surreal e surpreendente. Da parte do líder da bancada do PSD surgiu o elogio à proposta; a manifestação de dúvidas quanto à sua oportunidade e alcance e a recomendação de que a Mesa a retirasse, incumbindo-se de acompanhar o estado do processo junto do Tribunal de Contas. Vários deputados (do PS e PSD) expressaram o desacordo com a criação da comissão: a maioria furando a unanimidade sobre o debate que fora proposto e tacitamente aceite na sessão anterior. O CDS-PP, na minha pessoa, manteve-se fiel ao que havia sempre dito: o assunto é importante e merece um debate mais profundo e uma comissão seria um bom método para o fazer de forma mais rápida, digna e competente.

A Mesa decidiu retirar a proposta e, se nada for feito, o assunto: ou morre por aqui (apesar de todos reconhecerem a importância de ser debatido mais profundamente) ou está nas costas do único órgão que soube estar à altura do seu papel (a Mesa da AM), demitindo-se a maioria dos deputados das suas competências legais, éticas e politicas.

Haverá razões para que se não investigue o assunto? Para que se não debata o que todos achamos ser importante debater? Pessoalmente não vejo nenhuma! Se alguém for capaz de as fornecer, disponha!

Carlos Bianchi

quarta-feira, 7 de outubro de 2020

PENSANDO A DEMOCRACIA (1)

     Winston Churchill, falando sobre a Democracia, disse, um dia, que era “o pior regime político… depois de todos os outros”. Olhando para a actualidade portuguesa ter-se-á que concluir que tal afirmação é, cada vez mais verdadeira. Poder-se-ia estar pior. Bastaria que, para eleger um presidente da Républica, se tivesse de escolher o menos mau de uma dupla como Trump / Biden. No caso português, a escolha será igualmente entre o menos mau, entre vários candidato, mas teremos necessariamente muito mais para escolher.

O sentimento geral é de que o sistema está decadente, preso a um conjunto de redes clientelares, onde o interesse público é substituído por uma lógica de perpetuação no poder pelos suspeitos do costume. O que, num país que há décadas vive numa constante e permanente concentração (de poder, de decisão e de investimento) em Lisboa, condena o seu interior ao despovoamento e o litoral à sobrelotação.

A nível local, a incapacidade de contrariar o centralismo do Estado e de construir uma linha própria de desenvolvimento, criou uma situação incontornável: o poder conquista-se e mantém-se em administrações locais gigantescas, alimentadas pelas promessas de emprego e investimento em troco dos votos e onde o investimento se faz em festas, festinhas, festarolas e em obras a pensar nos apoiantes..

A nível supra-municipal o panorama não é melhor! As Comunidades Intermunicipais (CIM) são estruturas administrativas intermédias, supostamente criadas para obter economias de escala, na maioria das vezes redundantes que canibalizam os recursos financeiros e o trabalho dos municípios e que aplicam a lógica do Estado: decidem em gabinetes sem conhecimento do terreno, passando o incomodo de aplicar as decisões aos municípios e freguesias.

As Regiões Administrativas, que deveriam existir e ser autónomas não serão criadas e o projecto de regionalização, em curso, substitui-as por Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) supostamente mais autónomas. O resultado desta reforma é uma falsa autonomia (porque continua a CCDR sujeita ao poder central), uma suposta democracia (a eleição dos órgãos dirigentes que se prepara é, na verdade, afasta os cidadãos da decisão e é uma nomeação partidária negociada e sujeita a ratificação por vereadores e deputado municipais que não foram legitimados pelo povo para decidir por ele, nesta questão).

O resultado deste estado da Democracia é inevitável: o crescimento das A.Venturas e do populismo (de direito e esquerda) que, há anos, grassam por Portugal; que dizem querer combater a situação e que nada mais fazem do que aumentar a lógica clientelar e subsídio-dependente. Mais do que isso! Originam mesmo um retorno às teorias: da infantilização/imbecilização dos cidadãos; da necessidade de autoridade ilimitada; do sebastianismo e dos homens providenciais que, com a queda da cadeira (em 1968) do último deles, deveria ter-se extinguido, em Portugal. Teorias que, nos últimos tempos (tanto politicamente, como fruto da crise pandémica que vivemos) parecem ter aumentado substancialmente.

Voltando ao início, a Democracia é o pior sistema político de todos… apenas porque quem tem a obrigação de o defender, tudo faz para abrir caminho a algo muito pior.

Carlos Bianchi

(escrito desobedecendo deliberadamente ao Acordo Ortográfico vigente)