A data que constitui o título deste nosso texto, amigos
leitores, constitui um marco na existência de Portugal e merece uma reflexão
profunda, mais profunda do que aquela que um pequeno artigo pode fazer. Apontemos
apenas caminhos.
Há 872 anos, numa pequena cidade (Zamora), muito disputada
entre cristãos e árabes, que, à data, pertencia ao Reino de Leão, um tratado
foi assinado, entre dois primos, Afonso Henriques e Afonso VII. Desse tratado
resultou o reconhecimento da independência do reino de Afonso Henriques e o início
do mais antigo Estado-Nação da Europa:
Portugal. Apesar da importância do tratado, a verdade é que são poucos os
que vêm, na data 5 de Outubro, a oportunidade de galvanizar a nossa importância
histórica, enquanto país. Infelizmente, tendemos a dar mais importância ao 10
de Junho, data com origem nos finais do seculo XIX, mas mais instrumentalizada
pela ditadura do Estado Novo e que, em bom rigor, nasce mais como exaltação a
um génio da pátria – Luís de Camões – e pouco tem que ver com a própria Nação.
Há 105 anos, em Lisboa, no culminar do golpe de estado iniciado
dois dias antes, pelas 9 horas da Manhã, José Maria Mascarenhas Relvas de
Campos, membro do Directório do Partido Republicano Português, proclama a Implantação
da República Portuguesa. De repente, deixamos de ter na chefia do Estado, um
rei, uma personagem que recebia o seu poder fruto, apenas, da sua relação familiar
e passamos a escolher um representante, de entre nós, a quem conferimos um
mandato, limitado no tempo, e cuja obrigação é zelar pelo cumprimento da
vontade do soberano Povo Português. Com os seus defeitos e virtudes é o sistema
politico que mantemos, em Portugal. É por isso que não consigo perceber por que
motivo o Sr. Presidente da República optou por não estar, hoje, presente para
homenagear um sistema político, que o elegeu e o tem como representante máximo.
Tal atitude revela uma total falta de respeito para quem o elegeu e grave incoerência,
mais própria de quem não é capaz de perceber qual o seu papel, para com a história
e o Povo que representa.
Ontem, em Portugal disputaram-se eleições legislativas e
fomos chamados a escolher quem queremos que nos represente, no Parlamento da
República. Exerceu-se uma das virtudes daquele sistema político, que Winston
Churchill apelidou de “a pior forma de governo,
salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas de tempos em
tempos" – a Democracia. Em liberdade e em consciência, acredito, os
portugueses decidiram conferir mandatos a 99 candidatos da coligação CDS-PSD, a
85 candidatos do PS, a 19 candidatos do Bloco de Esquerda, 17 candidatos da coligação
PCP/PEV, a 3 candidatos do PSD Madeira, a 2 candidatos do PSD Açores e a 1
candidatos do PAN[i].
Ora, daqui resulta que o Parlamento se dividira em duas grandes áreas: A
direita disporá de, pelo menos, 104 deputados e a esquerda de, pelo menos, 121
deputados. Isto significa que a direita vence as eleições, mas a esquerda tem
uma maioria parlamentar. Sem qualquer medo das palavras, Portugal tem à
espreita uma crise politica que, se vier a materializar-se, põe em causa todos
os sacrifícios que estamos a fazer, desde Março de 2010 (data de apresentação do
PEC 1, pelo XVIII Governo constitucional, liderado por José Sócrates). Por um
lado, o Presidente da República irá cumprir a tradição democrática de convidar
a coligação CDS/PSD para formar um governo, que a esquerda promete reprovar.
Por outro lado, o chumbo do programa de governo ou a aprovação das moções de
censura prometidas à esquerda, pode levar ao absurdo de serem convidado partido
que perdeu as eleições (PS) a formar governo, em coligação, com os elementos
mais radicais da política nacional. Por ultimo, tudo isto se arrastará até,
pelo menos 6 de Março de 2016, altura em que se poderá dissolver a AR e marcar
novas eleições, levando a eventuais perdas para Portugal e os Portugueses.
Concluindo, o 5 de Outubro de 2015, é, para um português
orgulhoso e para um republicano convicto, um marco histórico importante. Mas,
para um cidadão que acredita nas virtudes do sistema democrático, constitui um
derradeiro teste às suas convicções. Por um lado, não quero crer que os
partidos políticos do arco da governação (CDS, PSD e PS), não conseguirão gerar
os consensos necessários à estabilidade governativa. Por outro lado, não creio
que seja possível que, forças politicas com ideias de futuro para o pais tão
diferentes, como PS, BE e CDU, possam, em primeiro, aceitar governar um pais
depois de perderem eleições e, em segundo, conseguir conciliar politicas pró e
contra União Europeia, pró e contra integração no Euro e na NATO, pró e contra
o respeito integral dos compromissos com os nosso credores, para poder
governar. Finalmente, acho que, porventura, esta é a altura ideal para, em
Portugal, se implementar a experiencia de países, como a Holanda, onde a
cultura dos governos de coligação, pós-eleitoral e no interesse nacional é tónica
do sistema político.
Carlos Bianchi
Advogado
Castro Daire.
[i]
À hora que escrevo ainda não foram divulgados os resultados relativos aos 4
mandatos correspondentes aos círculos eleitorais relativos aos emigrantes
portugueses.