Historicamente, a Grécia Antiga é
a idílica pátria de alguns dos direitos fundamentais da Humanidade (pelo menos,
na visão ocidental que temos deles).Claro que esta nossa «visão» é anacrónica e
simplista quanto à realidade histórica.
No Domingo passado (dia 25 de
Janeiro de 2015), a Grécia Moderna passou, por um dos mais importantes da vida
democrática – a realização de eleições – e o povo grego, em liberdade e de
forma esclarecida, teve a oportunidade de eleger os seus mandatários, para os
próximos tempos.
Há muitos que, por aí, vão
augurando o surgimento de uma nova vaga de crise, por conta do discurso anti –
austeridade do partido mais votado. Outros há, que vêem, nos resultados das
eleições gregas, uma vitória da linha de pensamento mais esquerdista que os vai
catapultar para vitórias nacionais. Na minha modesta opinião, os comentadores
mais à direita e à esquerda que tenho ouvido e lido, sofrem da mesma miopia e propensão
para o simplismo, dos que acham que a Grécia Antiga é o local de origem da
Democracia e da Liberdade, enquanto princípios, com o conteúdo que hoje lhes
damos.
Em primeiro lugar, parece que os
analistas se esqueceram que o SYRIZA, que se apresentou a eleições no dia 25 de
Janeiro de 2015, já não é o que nasceu em 2004, nem o que foi para as ruas em
2010. Na verdade, a coligação de esquerda radical grega abandonou o discurso anti-europeu
e anti-moeda única, porque percebeu que uma Grécia, sem a Europa, levaria a
mais crises económicas e sociais. Manteve, honra lhe seja feita, a base
anti-austeridade do seu pensamento, apresentando ao povo grego, o seu caminho e
o seu modo de lidar, com a crise económica que o seu país atravessa. Mas fê-lo,
com propostas concretas e explicando as suas consequências aos gregos, sem se
importar muito com as ameaças externas, que, salvo melhor opinião, constituíram
uma forma intolerável de chantagem sobre uma nação soberana.
Em segundo lugar, o SYRIZA já
demonstrou, nos últimos dias, quanto pode ser flexível, ao aliar-se a um
partido conservador, eurocético, nacionalista e xenófobo, para formar governo. Em
comum, SYRIZA e ANEL têm uma única coisa, a política anti-austeridade. No resto,
não podiam ser mais diferentes. O que prova que o radicalismo pode soçobrar às
necessidades de manter o poder.
Em terceiro lugar, a vitória do
SYRIZA, na Grécia, pode dar alento a movimentos, como o «Podemos» espanhol,
mas, dificilmente, será um factor de alavancagem, para a esquerda radical
portuguesa. Isto porque, os movimentos da esquerda radical portuguesa, ao contrário
do SYRIZA, o que fazem é dizer que há alternativas à austeridade, mas não dizem
quais, nem nos explicam que consequências teriam. Ora, os portugueses, como os
gregos, também querem saber o que pode acontecer, se trilharem um rumo
alternativo, mas nunca o farão se não souberem quais as consequências. Logo,
dificilmente a esquerda radical portuguesa terá, do povo, um «cheque em
branco». Escaldados já estamos todos.
Em quarto lugar, a própria Europa
já percebeu que a política económica tem de mudar. As mais recentes propostas
de Mário Draghi e Jean-Claude Juncker, para financiar o sistema financeiro, por
um lado, e apoiar o crescimento das empresas, por outro, deixam antever que a
austeridade, por si só, não é solução para a crise económica que atravessamos.
Para terminar nestas eleições, partidos,
como os Gregos Independentes e a Aurora Dourada cresceram. Olhe-se para aquelas
forças políticas e para as Frente Nacional francesa e belga, o British National
Party inglês, o PND alemão, o PVF finlandês, o PPD da Dinamarca, os Partidos da
Liberdade austríaco e holandês, o Movimento por uma Hungria Melhor e a Liga
Norte de Itália e vemos, com preocupação, por certo, uma o crescimento de uma
linha de pensamento – a do isolacionismo xenófobo e ultranacionalista. Exactamente,
o contrário do ideal de construção da União Europeia – “o desejo de criar um
continente mais livre e justo à medida que as relações entre países se iam
desenvolvendo de forma pacífica, para evitar por todos os meios um novo
conflito entre os países europeus”. Isto, sim, é algo que nos
deve preocupar a todos, porque pode significar o regresso da Europa da primeira
metade do seculo XX.
Carlos Bianchi
Advogado
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https://entre-o-montemuro-e-o-paiva.blogspot.com