Desde 1974 e a propósito do 25 de
Abril, Portugal assiste a uma luta político-ideológica (idiota e sem sentido) sobre
a Revolução que não honra os seus ideais e os seus verdadeiros heróis.
De um lado, os que se arrogam «donos
de Abril» e da nossa Democracia. Do outro lado, os que suspiram com saudade do “estado
a que chegamos”, do autoritarismo, do paternalismo e do providencialismo do
passado.
Salgueiro Maia (a quem devemos
estar gratos pelo exemplo de desapego e abnegação com que encarou Abril)
responderia a ambos: Meus senhores, fizemos a Revolução em nome e por conta de
todos os Portugueses e só eles podem ser considerados proprietários do que
fizemos!
Este ano, em que o Povo Português
tem de estar recolhido nos seus lares, devido à crise pandémica que
atravessamos, esta divisão ideológica faz menos sentido. E só a essa luz se
compreende a decisao tomada de celebrar Abril com a sessão solene na Assembleia
da República.
Dir-se-á mais: a decisão revela mesmo
que a Democracia Representativa está definitivamente a morrer. Nenhuma mulher,
nenhum homem com assento na Assembleia da República, representa quem quer que
seja do nosso Povo – para muita tristeza minha nesta conclusão.
Os parlamentares que votaram a
favor da comemoração desrespeitaram todo um Povo que está obrigado, há mais de
um mês, a ficar recolhido por um dever geral de recolhimento que a defesa da
sua saúde, da saúde de todos, lhe impõe. Mas também todo o esforço dos que não podem
estar recolhidos estão a fazer para que possamos todos ficar bem.
Os parlamentares que votaram
contra, fizeram-no, não por um verdadeiro respeito para com Abril, mas porque
dele não gostam por razões bafientas e porque o que queriam era celebrar o
regresso do um qualquer velho Estado Novo.
Qualquer portuguesa e qualquer português,
patrióticos e democráticos, tem o dever de demonstrar o seu desacordo com a
decisão.
Sim, porque ser patriótico não é
ser seguidista ou omitir a sua indignação. É precisamente fazer o contrário.
Sim, porque agir eticamente não é
silenciar o que pensar, deixar de questionar uma decisão com a qual não concorda.
É precisamente agir em consciência e dizer o que se sente.
Este ano celebrarei o 25 de Abril
de 1974, como o faço há 42 anos. Mas não do modo como o tenho feito. Porque o
devo ao meu país e a homens como Salgueiro Maia.
Ele saiu á rua acompanhado com
outros militares para pôr cobro ao Estado a que chegamos, por amor à liberdade
e pelos milhares que perdiam a vida no Ultramar.
Eu, desligarei televisão e
rádio à hora da sessão solene, hastearei a bandeira do meu País, colocarei o
cravo ao peito e ficarei em casa. Por amor à liberdade e à democracia. Pelos
que morreram já nesta crise pandémica. Pelos milhares que estão em isolamento
social há mais de um mês. Em honra dos verdadeiros heróis anónimos que
diariamente asseguram que o País combate os efeitos da pandemia. E porque,
neste dia, ninguém poderá dizer que me representa, numa casa e num evento que
Portugal não quer.
Carlos Bianchi.