segunda-feira, 4 de maio de 2020

Dever de confinamento ou «pode sair mas é proibibido»


Em 19 de Março de 2020, Portugal acordou numa nova realidade.

O Presidente da República lançou mão de uma faculdade constitucional excepcional– o Estado de Emergência. E a maioria do país aplaudiu!

Afinal vivíamos uma situação sem precedentes. A narrativa geral referia-se-lhe como se de um conflito militar se tratasse. Nada melhor que recorrer a uma arma constitucional, apenas um grau abaixo da militarização da sociedade (o Estado de Sítio).

O Estado de Emergência significava uma porta aberta à supressão de direitos, liberdades e garantias fundamentais. Uma espécie de suspensão da democracia em nome do interesse público, da saúde pública.

Vários foram os que, com o seu clamor nas redes sociais, contribuíram para o recurso a esta arma. Os que apregoavam a necessidade de medidas mais restritivas da liberdade de circulação… Os que se insurgiram contra os que, dentro país, circulavam entre concelhos… Os que diziam, que o quadro legal «normal» não era suficiente para responder à pandemia… Os que, ainda, não perceberam o seu papel social e se acham detentores de uma autoridade que não possuem (e ainda bem)… Foram também estes quem, Estado de Emergência se revelaram projectos de tiranetes que, a tempo, foram expostos na praça pública.

Outros foram os que, embora tivessem duvidas quanto á proporcionalidade do recurso a tal arma, a aceitavam como necessária.

E, uma pequena franja da sociedade, disse-nos sempre que tal arma não era proporcional e/ou necessária, para responder ao flagelo da COVID 19.

O tempo o dirá, mas continuamos a achar que o Estado de Emergência foi importante na contenção da pandemia. Mas do ponto de vista jurídico (e correndo o risco de ser um dos que anda sempre a criar confusão nas palavras do 1º Ministro) se calhar quem defendia a desnecessidade do Estado de Emergência é que estava correcto.

Bastará perceber que a recente declaração de Estado de Calamidade contém, no ponto de vista de situação da liberdade individual, uma compressão idêntica. Por muito que se queira mudar o conceito de dever geral de confinamento para dever cívico de confinamento, as consequências são as mesmas. O primeiro tinha tantas excepções que mais parecia um queijo suíço. O segundo é o assumir de que todos querem comer desse queijo suíço. Na prática representam o mesmo «fiquem em casa, se …».

Talvez só a resposta das autoridades policiais seja diferente. Afinal, será diferente a resposta de um poder judicial suspensão ou, parcialmente, activo.

Começo a achar que, para muitos (até para quem eu achava democrata) o vaticínio de que «era necessário suspender a democracia por seis meses estava correcto». Vade retro.

Carlos Bianchi